sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

“Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos,
a alegria como quando se sente a garganta um pouco
seca e se vê que, por admiração, se estava de boca
entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que
estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles.
Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e
riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que
era a alegria da sede deles. Por causa de carros e
pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque – a sede
é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras – e
ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando
um pouco mais seca de admiração. Como eles
admiravam estarem juntos! Até que tudo se
transformou em não. Tudo se transformou em não
quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então
a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras
desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele
não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele
que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das
ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza
queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham
prestado atenção, só porque não estavam bastante
distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros,
quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar
um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram
então aprender que, não se estando distraído, o telefone
não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e
quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já
cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.”

Clarice Lispector.

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