sábado, 10 de dezembro de 2011

"E quero aceitar minha liberdade sem pensar o que
muitos acham: que existir é coisa de doido, caso de
loucura. Porque parece. Existir não é lógico.
(...) Ainda bem que o que vou escrever já deve estar
na certa de algum modo escrito em mim. Tenho é
que me copiar com uma delicadeza de borboleta
branca. (...) O fato é que tenho nas minhas mãos
um destino e, no entanto não me sinto com o poder
de livremente inventar: sigo uma oculta linha fatal.
Sou obrigado a procurar uma verdade que me
ultrapassa. (...) eu que quero sentir o sopro do meu
além. Para ser mais do que eu, pois pouco sou.
Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e
não há lugar para mim na terra dos homens. Escrevo,
pois sou um desesperado e estou cansado, não
suporto mais a rotina de me ser e se não fosse a
sempre novidade que é escrever, eu me morreria
simbolicamente todos os dias. Mas preparado estou
para sair discretamente pela saída da porta dos fundos.
Experimentei quase tudo, inclusive a paixão e o seu
desespero. E agora só queria ter o que eu tivesse sido
e não fui."

Clarice Lispector

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