terça-feira, 22 de junho de 2010

DAS VANTAGENS DE SER BOBO.

CLARICE LISPECTOR

O bobo, por não se preocupar com ambições, tem tempo
para ver, ouvir e tocar o mundo. O bobo é capaz de ficar
sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado
por que não faz alguma coisa, reponde: "Estou fazendo. Estou
pensando."

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os
espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo
tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia.

O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem.
Os espertos estão sempre atentos às espertezas alheias que se
descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples
pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver.
O bobo nunca, parece, ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o
bobo é um Dostoievski.

Há desvantagens, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou
na palavra de um desconhecido para a compra de um ar
refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo,
praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é
fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer.
Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste
era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria
caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em contrapartida, a
vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto
estar sempre tranquilo. Enquanto o esperto não dorme à noite
com medo de ser ludibriado. O esperto vence com úlcera no
estômago. O bobo não percebe que venceu.

Aviso: não confundir bobo com burros. Desvantagem: pode
receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das
tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a
célebre frase: "Até tu, Brutus?".

Bobo não reclama. Em compensação como exclama!

Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar
todos no céu. Se Cristo tivesse sido esperto não teria
morrido na cruz.

O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem
passar por bobos. Ser bobo é uma criatividade, como toda
a criação, é difícil. Por isso, é que os espertos não conseguem
passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em
compensação os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os
bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não
se importam que saibam que eles sabem.

Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não
confundir bobo com burro, com tolo, com fútil): Minas Gerais
por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem por não
não nascer em Minas!

Bobo é Chagall que põem vaca no espaço, voando por
cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor
que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de execesso
de amor. E só o amor faz o bobo.

2 comentários:

GUINA disse...

O PAÍS DO CARNAVAL

Depois de Leon Tolstoi e Fiodor Dostoievski, escritores russos do início do século XVIII, pode-se dizer, com raríssimas exceções, que os escritores de hoje são crianças ingênuas brincando de escrever, para atender à vaidade e às intenções financeiras: querem tanto estar no rol dos escritores da época como conseguir manter sua sobrevivência através do ofício nobre da literatura. Essa postura de raciocínio também recai para os que são vistos como artistas no campo da pintura, da música, do teatro e do cinema, porque, também com raríssimas exceções, um ou outro seriam, digamos, dignos dos louros de conceito de Artista, como conceituavam os gregos antigos e os renascentistas.
Atualmente, com o declive vertiginoso da ignorância, do surgimento das multidões iletradas nos quatro cantos do mundo, decorrente do novo modelo social de vida implantado pelo avanço das técnicas, da concentração de riquezas e, conseqüentemente, da alastrante luta pela sobrevivência, pode-se chegar à conclusão que tal realidade repercutiu no campo da inteligência estética. Hoje, diferente daqueles tempos mais recuados, a vida tinha para as pessoas um conjunto muito grande de valores estéticos, reflexivos e contemplativos do que hoje, já que naquela época a pessoa que se dedicava, por exemplo, a alguma atividade artística, fazia-o não apenas com esmerada dedicação mas tinham uma inclinação muito grande ao conhecimento em geral. Por isso a Grécia antiga e a Renascença ofereceram, ao mundo, grandes e verdadeiros artistas, nos variados campos. Atualmente, a coisa mais difícil é encontrar na residência desse ou daquele artista, dessa ou daquela atividade estética, uma boa e excelente biblioteca, com livros tratando de assuntos variados.
A época de hoje, não vem produzindo mais grandes artistas ou gênios da criação estética, seja na pintura, na música, no cinema, no teatro como na literatura. Estamos, em verdade, experimentando ou atravessando por um grande atraso no mundo das atividades culturais, justamente porque tais ex pressões ou objetos de arte que vem sendo produzidos no mundo de hoje, estão sendo feitos por pessoas sem muita desenvoltura de espírito e excelente qualidade de pensamento reflexivo. Daí as péssimas e repetitivas temáticas no campo da música, da literatura, do teatro, do cinema e da pintura. Essa é a época dos pseudo-artistas, criados e moldados pela mídia que se encontra em poder de mega-empresários voltados para um tipo de programação lucrativa e que não incentive a população ao pensamento mais elevado, assim como, na história antiga, os Imperadores faziam com relação ao Coliseu Romano, que era um lugar que divulgava para a sociedade da época apenas tipos de apresentações que não induzia à sociedade a pensar sobre seu destino e futuro

GUINA disse...

A grande arte é aquela que tem como centro e objetivo final, o homem, como expressão de valores morais, estéticos, econômicos, políticos, filosóficos, teológicos, etc e, como meios para que essa arte ressalte seu objeto maior, que é o homem, que ela tenha a astúcia e inteligência de trabalhar com os estratos culturais e o sistema simbólico que regem uma sociedade qualquer, sempre de uma forma e maneira que critique esse ou aquele estrato ou símbolo que impede o crescimento e a evolução digna do homem e da sociedade. O espírito da Arte é questionador. Ele levanta indagações, sugestões e interrogações a respeito de toda uma conjuntura, todo um texto e contexto em que o homem está existindo e vivendo. Podemos dizer que o que está acontecendo no mundo moderno é o nascimento e a persistência de uma arte pobre, pequena e sem muita expressão de grandeza ou de valor. Todavia, podemos admitir também que vivemos numa época em que praticamente não existe mais espaço na mídia televisiva, escrita ou falada para a divulgação das grandes criações artísticas, principalmente se tais criações girarem em torno da importância do homem e da finalidade do sistema de símbolos com relação ao destino dele, do homem.
Pois, Tolstoi e Dostoievski foram, no campo da literatura, esses dois grandes escritores que, com sua forma de escrever, de pensar através da literatura, com a criação de seus personagens e de suas histórias, fizeram, e ainda fazem, com que seus leitores fiquem pasmos e impressionados com a inteligência e firmeza como vai trazendo, nas páginas, idéias e pensamentos, questionamentos e reflexões que nem mesmo a força do tempo os apagam. Daí eles terem sido considerados como verdadeiros monstros sagrados da literatura de todos os tempos, sem se venderem ou se renderem nem à vaidade nem, na época, às promessas feitas pelos proprietários gráficos da época, no sentido de escreverem de outra forma, ou seja, de maneira mais ingênua e tola, a fim de que atendessem satisfatoriamente ao mercado. Além de grandes escritores, foram homens que participaram direta ou indiretamente dos destinos do povo russo da época, sempre combatendo as formas de injustiças sociais existentes em seu país, mostrando-se, antes de mais nada, comprometido moralmente com um destino mais digno e honrado para o povo russo em geral.
Hoje, no campo da música, do teatro, do cinema, da pintura e da literatura estamos carentes, cada vez mais, desses fenômenos, fato que contribui, e muito, para que a sociedade se imbecilize cada vez mais, para que o povo se bestialize a cada instante de cada dia e que, no futuro, o CONGRESSO NACIONAL BRASILEIRO torne-se, não mais uma casa de grandes representantes políticos, com elevado grau de conhecimento crítico e saber jurídico, além de caráter ilibado, mas simplesmente uma casinhola representada por todo tipo de figura folclórica, de duvidosa formação moral e caráter duvidoso, sem nenhum conhecimento ou formação de cultura geral mas que, pelos princípios de uma democracia, como a nossa, formada por uma sociedade de maioria absoluta de analfabetos e medíocres, vão, em cada pleito eleitoral, eleger nossos “representantes” para legislar.

Guina